segunda-feira, 27 de outubro de 2014

O Coração Valente vence o Retrocesso #Eleições2014

Faltavam poucos minutos para as oito horas da noite de ontem, domingo, 26 de outubro de 2014, quando cerca de 93% dos votos para a Presidência da República haviam sido apurados. Cada um dos lados adversários, roendo as unhas e com os corações acelerados, estava se preparando para um infarto coletivo.

Quando os primeiros resultados foram divulgados e Dilma Rousseff aparecia com 50,99% e Aécio Neves com 49,01%, o Brasil provavelmente parou. A disputa estava apertadíssima. Todavia, ao final, o resultado era certo: Dilma foi reeleita com 51,64% dos votos válidos, dando continuidade ao Partido dos Trabalhadores na Presidência.

Para mim, uma vitória dolorida, após um caminho longo e bastante tortuoso. Ainda que os governos petistas estejam longe de serem ideais, foram eles os grandes responsáveis pelo imensurável aumento na qualidade de vida de milhões de famílias brasileiras, fosse através do Bolsa Família, dos programas voltados para a educação ou do simples aumento e reajuste do salário mínimo acima da inflação. É por isso que ontem eu votei sem remorso. Diferentemente de alguns setores da esquerda, não acredito que o PT seja igual ao PSDB, mesmo que ambos compartilhem defeitos bastante graves. Porque se fossem, o País provavelmente não seria tão reconhecido internacionalmente por sua luta contra a pobreza, suas boas relações com potências dos mais diversos polos e pela capacidade de enfrentar uma crise que abalou até mesmo as nações mais poderosas do planeta.

Ainda assim, sabemos que não será fácil para Dilma e o PT governarem. Afinal, o capital continua lá, aliado à grande mídia, preparando todos os tipos de ataques. O caso da Petrobras provavelmente será explorado até os últimos limites, o mensalão pode voltar à tona, além de várias outras denúncias, algumas verídicas e outras caluniosas. Também estará lá o PMDB, comandando o Congresso que, por sinal, está bastante conservador – ao que parece, o mais conservador desde 1964, ano do Golpe Civil-Militar. Em outras palavras, é bom que o PT se cuide se quiser se manter no poder, ou mesmo evitar uma ascensão da direita, que já vinha se fortalecendo há bastante tempo.

Portanto, agora é momento de cobrança. Muitos comentários nas redes sociais criticavam a população por ter ido às ruas em junho de 2013, mas reelegido Dilma agora. Para mim, mudança não é necessariamente transição de poder, não com a polarização que temos no Brasil. Se queremos mudança, mais do que trocar de partido no governo, temos que cobrar o que foi prometido e também pressionar o Legislativo, que em geral tem um peso muito maior na maioria das decisões de uma nação que o Executivo.

Cobrar do PT agora é essencial. Há muito a ser feito, muito que não foi feito e muito que foi feito “para o mal”. Temos que sempre lembrar que foi no governo Dilma que foi vetado o kit anti-homofobia. Que foi no governo Dilma que ocorreu uma das mais longas greves universitárias federais da História. Que foi no governo Dilma que a demarcação de terras indígenas e a reforma agrária ficaram na gaveta. Mas também foi no governo Dilma que saímos do Mapa da Fome, que conseguimos o Marco Civil da Internet, que foi aberta a Comissão Nacional da Verdade. E é graças a todas estas conquistas que eu ainda acredito que é possível mudar isso e tenho esperanças de que vamos conseguir, sempre com muita luta.

No fim das contas, o povo brasileiro continua a sair ganhando. Aécio Neves perdeu nas urnas, mas a maior derrotada destas eleições é, sem dúvidas, a imprensa tradicional. Obrigada a transmitir o discurso de vitória de Dilma, a Rede Globo teve que ver a militância do PT gritando “O povo não é bobo, abaixo a Rede Globo!” ao vivo para todo o Brasil, em uma cena memorável e absolutamente impagável. E é isso que esperamos ver cada vez mais: um país que não se deixa mais levar pelo que o poder de mídia diz que somos, mas sim pelo que sabemos que somos.

Que venham mais quatro anos! #DilmaNovamente

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Links válidos de dar uma olhada:


MG e Rio ajudam a reeleger Dilma e embolam discurso (ressentido) sobre Sul x Norte, por Matheus Pichonelli

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Quem são os filhos do futuro?

Depois da vergonhosa performance de Levy Fidélix no penúltimo debate presidencial, repercutida até mesmo na imprensa internacional, viu-se muita revolta, mas também viu-se muito apoio. Com o mesmo discurso com que defenderam Rachel Sheherazade sobre o caso “adote um bandido”, muitas pessoas aplaudiram a atitude do candidato do PRTB e disseram que ele “tinha coragem” de se expressar daquela maneira. Lembrou-me muito do caso de Sheherazade principalmente porque não me parece ser um ato de coragem, mas sim apenas a repetição de um jargão que todo mundo já diz nas ruas e que aparece sim com muita frequência na mídia, só que de maneira mais indireta.

De qualquer forma, uma coisa que me chamou a atenção nesta situação hedionda foi Levy falar em “instruir seu filho e instruir seu neto”, ou seja, colocar valores na cabeça de seus descendentes que preguem a intolerância às minorias. Acabou retornando algumas memórias que vi em várias famílias com que convivi ao longo da minha vida, e me fez pensar no quão grave é a questão da educação familiar no Brasil. Portanto, gostaria de tratar um pouco desta questão neste post e quem sabe em outros, afinal, este é um tema delicado que exige muito mais do que uma única discussão.

As pessoas gostam de dizer que as crianças são a esperança de um futuro melhor. É uma ideia bonita, mas quando eu vejo um pai ou uma mãe dizer para seu filho pequeno que “matar é feio, matar é mau” ao mesmo tempo em que recita frases como “bandido bom é bandido morto” ou “tinha que linchar todos esses vagabundos”, me pergunto se realmente poderemos contar com a juventude do futuro. Crianças veem, ouvem e aprendem frases como estas sem saber distinguir seus significados, acabando por repeti-las e assimilá-las. O mesmo acontece quando elas ouvem coisas como “aquele seu tio é um viadinho, namora meninos”. Junte às piadas e ao preconceito disfarçado de tolerância (“tenho até amigo gay” ou “não sou contra, mas quero longe de mim”) e a criança acabará aprendendo que “gay” e “viado” são coisas ruins. E assim por diante com outras minorias – negros (“tinha que ser preto!”, “isso aí é serviço de preto mesmo!”), indígenas (“índio é tudo vagabundo, não gosta de trabalhar”), mulheres (“mulher no volante, perigo constante”, “mulher pra comer e mulher pra casar”) e religiões não cristãs (“terreiro é coisa do capeta!”).

Vale lembrar que a maioria destas situações eu vi com meus próprios olhos ou ouvi relatos de pessoas próximas. Pessoas que se dizem esclarecidas, pessoas que dizem não ter preconceitos, mas que ao mesmo tempo dizem que vivemos uma ditadura de minorias, que não se pode falar mais nada, que os valores estão se deturpando, que as pessoas “não sabem mais o seu lugar”. São pessoas essas as que se dizem muito boas - porque doam sangue, porque doam roupas para os desabrigados pelas chuvas, porque trabalham em uma empresa que gera fundos a uma instituição filantrópica – e pensam que isso é suficiente para alcançar a justiça social. São também pessoas que dizem que você deve estudar para ser alguém na vida, que “você deve batalhar e assim vai vencer na vida”, e que fala “rolezinho na agência de emprego que é bom nada, né?”. E assim, repassam isso para seus filhos, netos, sobrinhos – a ideia de que a caridade e a meritocracia vão resolver as desigualdades, entre outros valores baseados em uma realidade essa sim deturpada. Assim, xs filhxs crescem e se não houver qualquer fator que xs incentive a questionar sua formação, elxs continuarão a disseminar preconceitos com máscara de “liberdade de expressão”.

Será que é mesmo esse o futuro que queremos? De crianças que vão ficar estagnadas na opinião dos familiares, talvez até que irão regredir em relação a gerações anteriores, ou será que queremos progresso, igualdade e liberdade para todos?

Uma coisa é certa: cada vez que eu vejo uma criança inocente, ingênua e curiosa crescer em uma família que incentiva esse tipo de comportamento reacionário, eu sinto pena. Da criança. Porque pelo futuro, sinto medo.