Considerado por muitos como o “início do fim” para o governo de João
Goulart e para as democracias populistas, o Comício da Central do Brasil,
ocorrido em 13 de março de 1964, foi um dos grandes marcos da promoção das
Reformas de Base.
A imagem de Jango sempre fora associada ao comunismo, devido a sua atuação como Ministro do Trabalho do segundo governo de Getúlio Vargas. Quando assumiu a presidência, seu caráter social e amplo apoio popular preocuparam as classes dominantes. O ápice disso se revelou justamente no Comício da Central, que contou com cerca de 150 mil pessoas, entre servidores públicos, sindicalistas, estudantes, militares e outros setores da população. Além disso, o presidente ainda assinou dois decretos, ainda que, àquela altura, eles fossem apenas simbólicos: a desapropriação de propriedades rurais subutilizadas e de refinarias que não pertencessem à Petrobrás.
Resumindo as reformas de base, tem-se:
· Agrária
· Administrativas
· Educacionais
(mais vagas nas universidades)
· Bancárias
· Fiscais (Lei de
Remessas de Lucros)
· Habitacionais
· Voto para
analfabetos e militares de baixa patente
A aprovação às medidas de Jango era clara – assim como o apoio de diversos
setores de esquerda, como o Partido Comunista Brasileiro, que
demandava sua própria legalização. Este apoio atemorizava os setores
conservadores dominantes, que já receavam uma ascensão socialista desde os
tempos de Getúlio Vargas. Segundo relatos do General Antonio Carlos Muricy, em
documentário sobre Jango, os militares, com o que ele chamou de “subversão
levada pelo governo [que] estava em crescimento dia-a-dia”, se mostravam
determinados a enfrentar qualquer coisa para derrubar o governo populista, que
eles julgavam nocivo ao país.
Assim, o Comício da Central do Brasil foi premissa para a Marcha da
Família com Deus pela Liberdade, seis dias depois.
Como podemos relacionar isso com o cenário político atual?
É evidente para todos os brasileiros que há uma crise política
acontecendo no país. E ela é muito similar à que ocorreu no período que
precedeu o golpe de 1964: os setores conservadores, como os militares e as
elites, acreditavam que o governo planejava um golpe comunista, sendo que o
governo janguista, de comunista, nada tinha. As reformas de base faziam parte
de um conjunto de medidas democráticas, provenientes de um ideologia de
esquerda sim, porém dizer que elas eram uma ameaça para a ordem consiste apenas
em interesses políticos.
O mesmo acontece com o atual governo – que é ainda menos “comunista” do
que o de Jango – com a diferença que hoje a disseminação da informação através
da internet favorece a divulgação de ideias de todos os lados. A partir de
junho de 2013 até hoje, vê-se uma exacerbação dos insatisfeitos com o atual
governo, ainda que de acordo com as recentes pesquisas eleitorais, estes sejam
minoria.
O problema é que uma parcela, dentre estes insatisfeitos, se destaca por
ser radical e ultranacionalista. Ao invés de sugerir uma reforma democrática,
respeitando a constituição e os direitos humanos, este grupo prega a volta da
“caça aos comunistas”, incitado por alguns veículos de mídia e por extremistas
populares. Muitos deles anseiam por uma intervenção militar.
Porém, onde estão os comunistas do governo atual?
Assim como Jango, ao atual governo tem propostas de melhorias sociais.
Todavia, também como no tempo de Jango, quem está na maioria dos postos do
poder ainda são as elites: os empreiteiros, os latifundiários e outros grandes
empresários. Podem não aparecer publicamente, mas detém o poder decisório.
As classes mais baixas, diferentemente do que alguns extremistas pensam,
não vivem em regime socialista. Muito pelo contrário - vivem no mesmo
capitalismo em que os ricos vivem. No entanto, estão na outra extremidade: são
aqueles que fornecem a mão-de-obra, a preços baixos, para o acúmulo de capital
dos empresários. E têm que pagar os mesmos impostos, pagar os mesmos preços no
supermercado, trabalham tanto quanto ou infinitas vezes mais que os peixes
grandes. Ou seja, em nossa sociedade, não é possível viver sem capital, e sem
trabalho não há capital. Em uma sociedade socialista, não deveriam todos
receber um mínimo subsídio? Não haveria educação e saúde de qualidade para
todos? Não há nada disso Brasil.
Então pergunto novamente: onde estão os comunistas do governo atual?
Fecho esta reflexão afirmando: vivemos em um regime extremamente
capitalista, portanto, militares e extremistas simpatizantes, não há nada a
temer. Não há comunistas do governo. Talvez haja uma política de ascensão
social sim, que visa tirar as empregadas da miséria, de modo que as madames
sejam obrigadas a lavarem suas próprias calcinhas*. Mas esta política é muito
lenta e sua eficácia ainda é duvidosa, já que ainda vivemos em uma oligarquia
onde a desigualdade é a prova de que a meritocracia capitalista não passa de
uma falácia.
*Quando além de tudo, o conservadorismo das elites subentende o
patriarcado, de modo que a mulher ficaria responsável pela casa. A frase faz
parte da crítica ao machismo também.
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