segunda-feira, 28 de abril de 2014

Em defesa da Comissão Nacional da Verdade

Há algum tempo eu venho observando um fato que definitivamente me deixou estarrecida: gente criticando a Comissão Nacional da Verdade, instalada em maio de 2012. Jamais me passou pela cabeça que tantas pessoas – ignorando aquelas que pedem por uma intervenção militar, as quais têm uma opinião um tanto questionável, ao meu ver – poderiam considerar uma Comissão criada para investigar torturas e assassinatos de insurgentes a uma ditadura como algo desnecessário ou até mesmo indiferente à democracia.

O primeiro fato deste tipo que me espantou foi a reação negativa à exumação dos restos mortais do ex-presidente João Goulart, a qual eu defendi arduamente. Junto disso, comentários em portais de notícias dizendo coisas do tipo “O que é que essa comissão faz mesmo?” e “temos que resolver o presente, o passado não muda nada!” representam a completa negação do que provavelmente uma das poucas grandes vitórias da redemocratização em relação aos crimes cometidos na ditadura.

Comissões da Verdade existem pelo mundo todo – a primeira foi instalada em Uganda em 1974 – e muitas delas ajudaram fortalecer a democracia, ao menos em parte, de boa parte de seus países de origem. Afinal, o povo que conhece seu passado conhece também as origens dos problemas sociais e portanto é mais capacitada a resolvê-los.

Infelizmente, este ainda não é o caso do nosso Brasil, onde a população acha que toda a desgraça social está centrada no atual governo. A corrupção não foi inventada nos anos 2000, nem em 1980. Ela sempre esteve presente, inclusive no governo civil-militar (provavelmente, diga-se de passagem, o governo mais corrupto da nossa história recente), que justificou o golpe não só na suposta armação comunista, mas também na corrupção governista. Portanto, antes de dizer que os problemas estão no presente, olhemos para trás e observemos o que mudou e o que permaneceu. Será que a origem do descaso não vem lá de trás?

A CNV é um dos instrumentos para isso. Creio que ela não só serve para transparecer a História, mas também para ajudar a punir quem não foi punido (leia-se os torturadores – os torturados já cumpriram além da pena). Ou seja, ela é caminho para alcançarmos outros atos de justiça, não só cometidos entre 1946 e 1988 (período investigado pela CNV), mas também aqueles de hoje. Os alicerces de muito do que acontece hoje provavelmente se encontra neste período.

Portanto, gostaria de reiterar meu total apoio à Comissão Nacional da Verdade – inclusive defendendo sua continuidade após o final deste mandato, adiado para dezembro deste ano. Eu espero, sinceramente, que ela ajude trazer à tona respostas para nosso atuais conflitos, e tenho um certo otimismo quanto a isso, já que muito já foi descoberto pela Comissão e vem popularizando a história do nosso país de uma maneira mais transparente.

Não estou dizendo que resolver o passado é a prioridade, e que os problemas atuais não são importantes. O que eu quero esclarecer é que enquanto negarmos a apuração do passado, jamais sairemos dele. Em outras palavras, o presente deve ser resolvido conhecendo o passado e suas controvérsias devem ser resolvidas juntas, utilizando-se dos benefícios que a História pode trazer para o conhecimento do nosso próprio país.

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